sábado, 2 de junho de 2012

Justiça

   Noite alta no Rio de Janeiro. Seus habitantes dormem traquilamente, alheios ao que acontece ao seu redor, perdidos na terra dos sonhos, em uma realidade distante e abstrata. Uma mulher, uma das poucas pessoas que ousam se aventurar nas ruas em um horário tão inapropriado, caminha apressadamente, ansiosa por chegar o mais rápido possível em sua casa, onde espera ficar em segurança. Tem medo, sente-se insegura por estar sozinha, completamente a mercê de um lunático qualquer, sujeita a qualquer risco. Já foi assaltada. Uma experiência nada agradável. Mais de uma vez, perdendo em uma dessas oportunidades, o salário suado de seus serviços como diarista. Consequências da falta de segurança em uma grande metrópole, aliada a falta de justiça. Marginais costumam cumprir penas irrisórias por seus feitos, ganhando liberdade em questão de horas. Mundo injusto. Sociedade carente de atitudes do alto escalão, o governo, quase sempre ausente nas questões mais importantes.

   Adentrou em um beco, um atalho que lhe ajudaria a economizar alguns minutos consideráveis. Estava um tanto escuro, quase impenetrável. Apressou o passo, sentindo um calafrio gélido passar por seu corpo. O medo revisitando suas sensações, acelerando os batimentos cardíacos, descordenando a respiração, que saia imprecisa, de uma maneira um tanto trôpega. Então, um ruído indefinido se fez ouvir, fazendo com que a mulher interrompesse seus movimentos por completo. Parou aterrorizada, tentando imaginar qual seria a origem de tal som. Não demorou nada para descobrir. Em meio as sombras, surgiu um homem corpulento, com um canivete afiado nas mãos, pronto para ser usado. Exibia um sorriso carregado de más intenções. Foi até a mulher, colocando o canivete em seu frágil pescoço, para então dizer:
- Uma dama como você na rua até uma hora dessas, com certeza está em busca de um pouco de diversão. Sorte que eu também estou. Tira a roupa.
- Por favor, me deixe ir! Tenho filhos para cuidar, uma família. Não me faça mal. - Disse a mulher, com uma expressão tomada pelo mais puro terror.
- Não lhe farei mal nenhum, ao contrário, vou te proporcionar uma noite incrível, acredite. Garanto que sou muito mais dotado que o babaca com o qual você é casada. - Disse o homem, insinuando-se, lambendo o pescoço da mulher com um desejo incontrolável.

  Inesperadamente, o homem do canivete foi agarrado pelos braços, sendo atirado contra um muro de concreto com uma força incrível, própria de um indivíduo conhecedor das artes marciais mais brutais. Um desconhecido trajado de uma vestimenta escura e uma máscara de hockey surgiu. Ofereceu sua mão para a mulher, que estava caída no chão, desamparada, quase aos prantos. Encarou-a com seus olhos vazios, indefinidos pela máscara, e disse:
- Vá embora. Eu cuido do resto.

   A mulher virou-se sem ao menos agradecer, e correu desesperada, ansiosa por se ver o mais distante possível do molestador de más intenções, que por pouco, não havia conseguido alcançar seus nefastos objetivos. O misterioso da máscara caminhou sem pressa até o homem atirado ao chão, erguendo-o pela gola da camisa de uma só vez. Acertou-lhe em cheio com três socos fortíssimos na face, que lhe arracaram de uma só vez, a metade dos dentes que se encontravam na parte frontal de sua boca, além de fraturar o nariz do infeliz, que jorrou sangue na mesma hora. Encarou o marginal com uma fúria capaz de se sentir de longe, e disse, com a voz carregada por um ódio quase mortal:
- Não vai fazer nada? Pra onde foi aquele homem másculo de antes, o rapaz bem dotado? Me responda!- Berrou, acertando um soco avassalador na boca do estomâgo do molestador, que abaixou-se tomado por uma dor incontrolável. Gorfou de imediato um jato de sangue. - Seu merda. Aposto que já foi preso várias vezes. Graças ao sistema judiciário, as leis fracas desse país, devem ter te libertado rapidamente, dando-lhe novas oportunidades de fazer mal a quem nada tem a ver com sua demência mental. Maldito. Dessa vez, você não escapa. Não sou tão gentil como os polícias com os quais costuma conviver. Eu vivo em nome da justiça, e em nome dela, tudo faço. Sou o desejo do povo, que clama por uma punição severa a marginais como você, que nada fazem pelo bem dessa nação. Escória. Apenas um verme, um desagregador, que vive apenas para desgraçar com os justos. Seus dias de atos insanos terminaram.
- Não me mate, por favor. - Disse o homem, esforçando-se para conseguir articular tais palavras. Seus lábios estavam completamente cortados, graças ao impacto poderoso dos golpes do misterioso da máscara.
- Quem falou em matar? Eu estaria me rebaixando ao seu nível se fizesse isso. Não sou um assassino. Apenas farei justiça, como nos velhos tempos, no glorioso império romano. Sabe o que faziam com bandidos como você? Castigavam da maneira devida. Quem usava as mãos para fazer o mal, era condenado a perdê-las. O que acha de tal destino? Interessante? Eu classifico como digno para alguém tão repulsivo. - Disse o homem da máscara, notando um desespero crescente na expressão mortificada do homem.
- Por favor, não... - Clamou o molestador.
- Aposto que quando suas vitímas dizem isso, você simplesmente as ignora. Gosto dessa atitude. Vou fazer o mesmo. - Disse o homem da máscara, agarrando os dedos de ambas as mãos do molestador, torcendo-os para trás com todas as forças de seu corpo, fazendo-os se quebrarem praticamente ao mesmo tempo. O homem gritou de dor, caindo inconsciente ao chão logo em seguida.
- Verme. - Disse o homem da máscara, pisoteando os braços do molestador, fraturando-os em várias partes. - Isso deve bastar. - Disse, deixando o beco silenciosamente em seguida.

   No dia seguinte encontraram o molestador jogado no chão, berrando como um louco, devido as dezenas de fraturas espalhadas por seus braços e mãos. Foi levado ao hospital. Se recuperou depois de meses. Os ossos cicatrizaram, mas de uma maneira um tanto fossilizada. Tinham se partido em muitos pedaços, acabando por diminuir os movimentos capazes de ser realizados pelo molestador, que depois dessa experiência, resolveu mudar de vida. Virou um bom rapaz, quem diria! Trabalhador, esforçado. Passou a controlar seus desejos indecentes, a respeitar damas desprotegidas altas horas da noite. Nunca mais cometeu um único crime. Passou a respeitar a justiça. Não a criada pelos homens, registrada em um pedaço de pápel, esquecida em escritórios judiciais. Passou a respeitar a justiça na forma de um homem. O misterioso da máscara.  O justiceiro do povo, o vigilante das noites mais negras da maravilhosa Rio de Janeiro


  


  

  

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